sábado, 31 de outubro de 2009

A loira da Uniban e a covardia dos bandos


Nesta semana, fiquei chocada com a notícia sobre a garota humilhada na Uniban por colegas que acharam sua roupa indecente para ir à faculdade. Pelo estado em que os estudantes estavam no vídeo que assisti, imaginei que a moça tivesse ido quase nua às aulas. Mesmo ssim, não deveria ter sido tratada como foi.

Mas depois que vi uma foto dela usando o tal vestido curto, fiquei mais pasma ainda. Era um vestido de balada. Curto, sim, inadequado para assistir aulas. Ela ia a uma festa com o namorado após a aula, por isso já foi vestida para a ocasião - o que é bem compreensível. Não usava nada parecido com o vestuário típico de prostitutas, como os colegas alegaram - e a quem a compararam. E, de novo, mesmo assim, ninguém tem nada a ver com isso. Pessoas equilibradas não saem por aí xingando ou ameaçando prostitutas só porque não gostam do modo como se vestem ou da vida que levam.

O que levou então aqueles estudantes todos a se comportar daquela forma absurda, xingando a moça e incentivando que fosse estuprada? Só me ocorrem duas coisas. Uma, inveja. Sim, a moça se acha bonita, gosta de se vestir de forma exuberante, mostrando que tem boa auto-estima. Provavelmente as mocinhas que começaram a persegui-la e detonaram a reação dos demais estudantes não sejam tão confiantes como ela e se sentiram ameaçadas ou afrontadas por sua segurança. A própria moça ficou espantada por ver meninas com quem pega ônibus todos os dias mostrarem tanta raiva sem qualquer motivo lógico. Mas não seria mais lógico e civilizado apenas não estabelecer contato ou amizade com a moça se não se aprova o modo como ela se veste ou se comporta?

E os demais, inclusive os meninos? Foram tomados pelo espírito do bando. Esse é o segundo motivo para o tumulto. Gente que não tem coragem de tomar atitudes como essa olhando olho no olho se aproveita da proteção do bando para fazer coisas que, em condições normais ou individualmente, não faria. É o que fazem as torcidas de futebol, por exemplo. Na minha opinião, coisa de gente fraca e covarde, incapaz de sustentar sua posição frente a qualquer pressão ou que aproveita o fato de estar em bando para liberar seus piores instintos certo da impunidade ou da proteção que o grupo lhe confere.

O pior foi ver os comentários postados nas notícias. Tem gente que defende a humilhação pública porque ela tem um perfil provocativo no orkut. Ora, mesmo se ela fosse uma prostituta ou garota de programa, deveria ser proibida de frequentar a faculdade? Será que vai haver o mesmo tumulto se aparecer um homossexual na mesma universidade? Cuidado, Uniban, esse pode ser o próximo caso a transformar a instituição em notícia. Com o nível de preconceito e conservadorismo dessa moçada, não é difícil que aconteça.

Mais uma vez, uma pessoa que ousou ser diferente da massa foi crucificada. Infelizmente, não será a última. Os medíocres, aqueles que só sabem seguir as convenções sem refletir sobre elas, e que preferem não ver ou conviver com o diferente para não ver abaladas suas próprias convicções, vão continuar julgando e atirando pedras naqueles que escolhem, conscientemente, a vida que querem viver.

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O psicanalista Contardo Calligaris encontrou ainda um terceiro motivo para a atitude dos covardes em bando da Uniban. Recomendo a leitura do artigo A Turba da Uniban, publicado na Folha de S.Paulo do dia 05/11.

sábado, 17 de outubro de 2009

Cegueira e religião

Considero-me uma pessoa religiosa. Não porque cresci numa família católica e tenha seguido todos os ritos do catolicismo até determinada fase da vida, mas porque acredito em Deus. Talvez isso explique minha curiosidade em frequentar as cerimônias de outras religiões, para conhecer as diferentes formas de se conectar com Ele.

Faz algum tempo que deixei de acreditar em igrejas e religiões, embora sinta simpatia por algumas - e continue sendo religiosa. Acho que cansei de ver as pessoas se apegarem a isso para justificar fraquezas e atos odiosos. Também não gosto da mania que os "líderes" de algumas religiões têm de se considerar donos da verdade, o único caminho de chegar a Deus, e iluminados que sabem o que é certo e errado para todos. Também detesto o barulho e o falatório que há na maior parte dos templos religiosos. Prefiro o silêncio e a discrição. Acho que por isso tenho mais simpatia pelas religiões orientais, como o budismo. Concordo com uma campanha bem-humorada que circula pela internet, acredito que Deus não é surdo. Por isso podemos ficar em silêncio e orar em pensamento.

Também desconfio daqueles que citam a religião o tempo todo para justificar seus atos, conquistas e erros, usam camisetas ou colocam adesivos no carro com frases sobre sua crença. Lembram-me aquelas namoradas ou namorados inseguros, que precisam ouvir "Eu te amo" o tempo todo, porque não acreditam de fato no amor do parceiro. No caso, devem ter pouca certeza da própria fé, caso contrário não precisariam ficar reafirmando isso constantemente. As pessoas mais religiosas que conheço não falam sobre igreja e religião - elas simplesmente vivem a sua fé.

Tampouco gosto de religiões ou seitas que pregam que é necessário castigar o corpo ou ingerir bebidas ou alimentos para abrir a percepção ao divino. Concordo com o que diz o educador e escritor Rubem Alves: "a minha experiência com o sagrado vem sempre fora de lugares religiosos, diante do mistério da noite estrelada, de uma teia de aranha, de uma árvore florida, da ternura do amor, do riso de uma criança, da frescura dos riachos, da graça do vôo dos urubus, da alegria do cachorro que me recebe. Essas coisas que me dão alegria e que, por isso mesmo, são para mim sagradas, eu nunca as encontrei nas igrejas. Sagrado, para mim, é aquilo que meu coração deseja que seja eterno. O sagrado é a realização do amor." Sendo assim, qualquer coisa que me turve os sentidos me afasta do que eu considero sagrado, não me aproxima.

Também não é Deus quem me faz ser um ser humano melhor. Procuro ser melhor porque acredito que assim minha vida terá valido a pena, não terei passado por ela à toa. Não recebi nenhuma revelação, nenhum milagre aconteceu na minha vida. São os acontecimentos do dia a dia que me movem a me corrigir. Não é o medo do inferno. É fácil jogar em Deus a responsabilidade dos nossos atos, mas essa responsabilidade é de cada um de nós.

Só que é preciso ter coragem para assumir essa responsabilidade, coisa que muito pouca gente tem, infelizmente. Por isso, as religiões estão aí, e novas são criadas o tempo todo, para servir de muletas a quem não consegue andar com os próprios pés ou de bengala aos cegos que não querem ver.

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Recomendo a leitura do texto de Rubem Alves cujo trecho coloquei em meu post. Lindo e esclarecedor, para quem acredita na religiosidade como nós.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

Mulheres impossíveis e o photoshop

O inventor do photoshop com certeza deve ter sido movido pelas melhores intenções para criar o programa. Não acredito que ele tenha imaginado o mal que essa ferramenta iria causar a mulheres do mundo todo.

Depois do photoshop, ficou inviável para qualquer mulher comum conseguir ser bela como uma atriz de cinema ou TV, por mais esforço que se faça e recurso que se tenha. Se antes de existir o programa isso já era difícil, porém possível para algumas felizardas abençoadas pela natureza, o photoshop tornou isso impossível. E não porque os retoques escondem algumas imperfeições. E sim porque o programa cria mulheres que não existem!

Confesso que eu mesma volta e meia caio na armadilha de acreditar na boa forma e a na beleza perfeita de atrizes e modelos, inclusive das mais velhas. E isso mesmo tendo trabalhado numa editora de revistas e ter visto, com meus próprios olhos, a transformação de mulheres bonitas em verdadeiras deusas gregas. Nunca me esqueço de quando vi um profissional eliminar o pneuzinho que insistia em sair da calça jeans vestida por Vera Fischer, além de tirar de seu rosto as olheiras e as ruguinhas em torno dos olhos provocadas por seu radiante sorriso. Se linda ela já era, ficou imaculadamente perfeita depois das intervenções. Sem falar na jogadora de basquete Hortência, que teve sua pele transformada em um superfície lisa, proeza que seguramente nem Ivo Pitanguy seria capaz de executar - caso contrário, com certeza já o teria feito.

Na semana passada, caí de novo na armadilha ao ver uma foto de Luiza Brunet de biquíni na capa de uma revista de fitness. Pensei: “Uau, como ela continua linda e com tudo em cima aos 47 anos”. E imaginei que as aulas de pilates que ela disse ser responsáveis por manter seu corpo durinho nessa idade são mesmo milagrosas. Confesso que até cheguei a cogitar trocar meus treinos diários de corrida por essa modalidade. Mas eis que novas fotos da eterna musa do Brasil publicadas na mesma semana me trouxeram de volta à razão: nessas fotos, tiradas na praia, sob um escaldante sol carioca, sem tratamento de photoshop, Luiza mostrava seu corpo do jeito que ele realmente é. Embora ela realmente esteja em boa forma para sua idade, seu corpo exibe todos os sinais do tempo que o de outras belas mulheres anônimas de sua geração: pele sobrando na axila e na parte interna do braço, sinais de flacidez na barriga (normal, ela passou por duas gravidezes), um pouco de celulite e flacidez no bumbum e nas pernas.

O mesmo aconteceu com a apresentadora Angélica. Sua foto na capa de uma revista de celebridades mostra um rosto alvo, liso, maravilhoso. Na foto de uma coluna social, podemos ver a pele clara com manchas e marcas de sol, normais em 99% das mulheres loiras como ela que vivem sob o sol brasileiro. E a Juliana Paes? Sim, ninguém tem um bumbum daquele tamanho durinho e sem qualquer marca - nem ela, como se pode ver nas suas fotos de praia. E aí, quando alguma dessas deusas mostra celulite em algum evento ao vivo, o fato acaba até virando notícia, como se elas fossem inusitadas e surpreendentes, e não as fotos tratadas pelos profissionais das revistas.

Ou seja, mesmo mulheres que vivem da aparência, e que por isso podem e precisam investir muito tempo e dinheiro para manter-se jovens e bonitas por mais tempo, são afetadas pelo tempo e pelas intempéries. Pele absolutamente lisa e firme, musculatura dura, só em atletas ou dos 14 aos 20 anos de idade – e olhe lá, porque as adolescentes e jovens de hoje têm hábitos alimentares tão ruins que muitas já exibem um corpo igual a muitas mulheres malcuidadas da minha geração. As mulheres das capas de revista são uma criação artística, não pessoas reais, por mais lindas que sejam ao vivo.

Depois de ver as fotos da Luiza "de verdade", fui até o espelho, olhei para o corpo ali refletido e fiquei em paz com ele. E prometi que não vou mais esquecer de que ele sim é real, está bem cuidado para o seu tempo de vida e que cada uma de suas marcas tem uma história e muitos bons motivos para existir.